(A série Telessaúde Responde divulga as perguntas enviadas pelos profissionais de saúde e respondidas pelo serviço de Segunda Opinião Formativa do Telessaúde SC. Acesse mais perguntas aqui)

Segundo orientações do Tratado de Medicina de Família e Comunidade¹ não é atribuição do médico que atua na atenção primária a realização de exames ocupacionais.  No entanto, existe uma divergência jurídica entre a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e a Lei Orgânica 8.080/1990 com relação a esse assunto.
Segundo a CLT, Art 168, o exame médico ocupacional é de responsabilidade do empregador e deve ser fornecido pelo médico responsável pelo Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO)²:
“CLT – Decreto Lei nº 5.452 de 01 de Maio de 1943
Art. 168 – Será obrigatório exame médico
por conta do empregador, nas condições estabelecidas neste artigo e nas instruções complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho: (Redação dada pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989):
I – a admissão; (Incluído pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
II – na demissão; (Incluído pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)
III – periodicamente. (Incluído pela Lei nº 7.855, de 24.10.1989)”

A Norma Regulamentadora número 07³ (NR7) do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) define que caberá a empresa contratante auxiliar na elaboração e implementação do PCMSO nos locais de trabalho onde os serviços estão sendo prestados. Sendo que o PCMSO deve incluir, entre outros, a realização obrigatória dos exames médicos³: a) admissional; b) periódicos; c) do retorno ao trabalho; d) de mudança de função; e) demissional.

A NR7 afirma ainda que compete ao empregador: a) garantir a elaboração e efetiva implementação do PCMSO, bem como zelar pela sua eficácia; b) custear, sem ônus para o empregado, todos os procedimentos relacionados ao PCMSO; c) indicar, dentre os médicos dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho – SESMT, da empresa, um coordenador responsável pela execução do PCMSO; d) no caso da empresa estar desobrigada de manter médico do trabalho, de acordo com a NR-4, deverá o empregador indicar médico do trabalho, empregado ou não da empresa, para reordenar o PCMSO; e) inexistindo médico do trabalho na localidade, o empregador poderá contratar médico de outra especialidade para coordenar o PCMSO.
O custeio do programa (incluindo avaliações clínicas e exames complementares) deve ser totalmente assumido pelo empregador, e, quando necessário, deverá ser comprovado que não houve nenhum repasse destes custos ao empregado³.
Como dito anteriormente, existe uma divergência entre a CLT e Lei Orgânica 8.080 / 19904. O artigo 6º da Lei Orgânica4 afirma que está incluída no campo de atuação do SUS a “informação ao trabalhador e à sua respectiva entidade sindical e às empresas sobre os riscos de acidentes de trabalho, doença profissional e do trabalho, bem como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde, de admissão, periódicos e de demissão, respeitados os preceitos da ética profissional; ”. Assim, segundo a Lei Orgânica caberia ao médico do SUS fornecimento de atestado admissional e/ou demissional.
No entanto, a realização de exames ocupacionais pelo médico da atenção primária esbarra na impossibilidade desse médico ter conhecimento prévio do ambiente de trabalho, sendo, por isso, difícil para o médico definir os riscos aos quais o trabalhador está exposto.
A partir disso, a dúvida que fica é: qual das leis deve prevalecer? A CLT ou a Lei 8.080/1990? Essa situação, no estudo do Direito, recebe o nome de ANTINOMIA, isto é, a presença de duas normas conflitantes, gerando dúvidas sobre qual delas deverá ser aplicada5. Os casos de antinomia são resolvidos no momento da aplicação do direito mediante o sacrifício de uma das normas ou o estabelecimento de uma delas subordinante da outra5.
Para solucionar essa questão, foi solicitado parecer do Conselho Federal de Medicina (CFM), protocolado sob o número 2098/2016. Segundo esse parecer, o exame médico ocupacional está disciplinado pela CLT, sendo, portanto, responsabilidade da empresa contratante. O CFM acrescenta ainda que pela hierarquia das normas, o Manual de Saúde do Trabalhador do Ministério da Saúde não invalida o que determina a CLT. Conclui que “nesse sentido, não cabe ao médico do SUS a realização do exame médico admissional, salvo melhor juízo”.

Bibliografia Selecionada

  1. CERATTI A; ANDO N.M; QUEIROZ O. Abordagem à saúde ocupacional na atenção primária à saúde. In: Gusso G, Lopes JMC. Tratado de Medicina de Família e Comunidade: princípios, formação e prática. Porto Alegre: Artmed, 2012.
  2. BRASIL. Casa Civil. Decreto Lei nº 5.452 de 01 de Maio de 1943. Consolidação das Leis Trabalhistas. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452compilado.htm>. Acesso em: 25 de fev de 2016.
  3. BRASIL. Ministério do Trabalho. Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho. Portaria nº 24, de 29 de dezembro de 1994 / DOU de 30-12-94 NR7: Programa de controle médico de saúde ocupacional. Disponível em: <http://sislex.previdencia.gov.br/paginas/05/mtb/7.htm>. Acesso em: 25 de fev de 2016.
  4. BRASIL. JusBrasil. Lei nº 8.080 de 19 de Setembro de 1990. Art. 6. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/11677165/inciso-v-do-paragrafo-3-do-artigo-6-da-lei-n-8080-de-19-de-setembro-de-1990>. Acesso em: 25 de fev de 2016.
  5. Faria, José Eduardo. Antinomias jurídicas e gestão econômica. Lua Nova : Revista de Cultura e Política. 1992, 25: p.167-84. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n25/a08n25.pdf>. Acesso em: 28 de abril de 2016

A qualidade das respostas elaboradas pelo serviço de Segunda Opinião Formativa é muito importante para nossa equipe de teleconsultores. Por esse motivo, pedimos que você avalie o conteúdo que acaba de ler no site da Biblioteca Virtual em Saúde. Obrigada!